quarta-feira, 16 de agosto de 2017

Imagine.

Exitem coisas que não podem ser realizadas parcialmente. Por exemplo, se queres construir uma casa, não podes fazer pela metade a estrutura que a sustenta. Não é preciso entender de obras para saber que, se a obra assim for feita, muito provavelmente alguma parte da casa estará comprometida e ruirá a qualquer momento, e todo o trabalho feito até então terá sido em vão. Acredito que até aqui estamos todos de acordo, certo? Então sigamos.
A respeito da educação, eu penso a mesma coisa. Não dá para esperar que um aluno seja bom e educado se ele não foi estruturado para tal. Não importa quantas aulas, não importa quantas atividades e reforços, reuniões e chamadas de atenção: se não há estrutura, não adianta querer completar o telhado. E a estrutura aqui é formada tanto pela família quanto pela escola.
Mas aí surgem várias questões e, entre elas, uma das mais cruciais é: qual é o papel de cada pessoa/instituição no processo educativo de um cidadão? Os pais devem fazer todo o trabalho com relação à questões básicas como respeito, bons modos? O professor deve restringir-se à matéria a qual leciona? É complicado.
Particularmente, acredito que a configuração em que a sociedade se encontra - muita informação o tempo todo, o que pode fugir ao controle dos pais; crianças permanecendo na escola em tempo integral; pais ausentes por excesso de trabalho (os eventuais casos de futilidade ou aborto opcional - metaforicamente falando, é claro - eu prefiro ignorar) e inúmeros outros aspectos -, tem tornado as linhas que estabelecem os limites entre esses papéis cada vez mais tênues.
Mas antes que possa ser mal compreendida, esclareço: não estou aqui dizendo que os professores devem tomar para si o papel de pais e simplesmente fazerem todo o trabalho de educação dos filhos alheios por conta própria. Não é isso. O que quero dizer é que existem questões que surgem em sala de aula que, na minha concepção, não podem ser ignoradas quando ocorrem ou, pelo menos, eu, mesmo sendo "apenas a professora de língua estrangeira", não consigo ignorar, pois tocam em um aspecto muito maior do que a mera educação curricular: tocam na humanidade.
Não consigo, por exemplo, ver o surgimento da questão de gênero e papel social quando alguma criança diz que "rosa é cor de menina" e não falar nada. Não é o caso de dar uma aula sobre sobre isso, mas é o caso de dizer que rosa é só mais uma cor, como todas as outras, e que qualquer um pode usar a cor que quiser, pois não há problema nenhum nisso. Faz parte da matéria que ensino? Não. Faz parte da educação? Sim. Não é nada, não é muito esforço e talvez nem mude a ideia da criança, mas é uma tentativa e, para a minha consciência, já é alguma coisa.
Sei que não dá para intervir em todas as situações, sei que não dá para esperar que o mundo mude com um comentário, e sei também que às vezes cansa - e muito - , mas acho necessário. Não dá para esperar que um garoto mais velho não chame o outro de "viadinho" porque está vestindo uma camisa rosa se, na outra oportunidade que tive, eu nem tiver tentado dizer que rosa não é um problema - ser "viado" também não, mas se dizer que rosa não é um problema já pode causar uma situação complicada com os pais (é, pois é, pode), imagine dizer algo sobre orientação sexual, rs, então aí pedimos ajuda.
No fim, tudo isso é pra dizer que eu tento, e acho que não custa todo mundo tentar. E acredito que se ainda há uma esperança de uma sociedade minimamente melhor, escola e pais precisam trabalhar juntos sim, inclusive quando questões de gênero, machismo e sexualidade surgem, pois tudo isso está dentro de uma coisa muito maior, que é o respeito. Ainda tenho essa esperança, acho, e vou tentar não me tornar mais uma do grupo dos que desistem de tentar.



"You may say I'm a dreamer, but I'm not the only one". Apelei mesmo, rs, guilt-free.